Um ano de Homomento

7 de abril de 2010

Hoje é um dia muito especial – pelo menos para esse blogueiro que vos fala. Há exatamente um ano o primeiro post de um blog chamado “Homomento” ia ao ar, como fruto de conversas entre amigos totalmente insatisfeitos com a mídia gay.

Um pouco acanhados e sem um plano específico de postagem/divulgação, fomos progressivamente inflando o site de conteúdo, seja com notícias ou reflexões bastante pessoais. Com a ajuda do twitter, principalmente do @gaybrasil, fomos conquistando leitores e followers, que carinhosamente apoiaram nosso trabalho com RTs e bons comentários.

Como essa lenga lenga institucional pode ser totalmente desinteressante, resolvi para esse post de um ano recapitular alguns dos meus textos favoritos do blog, que na minha opinião sintetizam nossos pontos de vista ou simplesmente foram feitos com esmero.

Criticando
Já mencionei que a crítica à mídia gay foi o impulso inicial desse site. Era inevitável, dessa forma, que essa temática aparecesse por aqui em alguns momentos – provocando até polêmica nas caixas de comentários. Enquanto esse texto da Carol é uma súmula do que pensamos, temos alguns outros, de peças e momentos específicos, que acabam caindo nesse enredo – aqui, aqui e aqui, por exemplo.

Conceituando-nos
Relacionar-se com pessoas do mesmo sexo é, ao menos na nossa sociedade, ter de obrigatoriamente lidar com conceitos. Defina-se. Defina sua sexualidade. Defina o preconceito que você sofre. Somos solicitados a dizer O QUE somos, PORQUE somos, a tentar situar as “origens” desse comportamento. Passamos por essas questões quando recorremos aos dicionários em busca da “homossexualidade”, encontrando mais pré-conceitos do que conceitos propriamente ditos. Confusos, tentamos também compreender o significado do termo “homofobia”, tão proferido por militantes. Desbravamos a última letrinha da nossa sigla (LGBT, para os desavisados), buscando um esclarecimento mínimo em relação a transexuais, transgêneros, travestis e etc.

Particularmente, acredito que chegamos a um ponto interessante no dia internacional da bissexualidade, 23 de setembro. Refletindo sobre uma sexualidade que é vista como “meio termo”, percebemos que na verdade os próprios “termos” são bastante questionáveis. No final das contas, mais desconstruímos do que estratificamos ideias. Parecemos ter, acima de tudo, uma saudável desconfiança das verdades absolutas da ciência, como se percebe no meu “A Sedução Científica” e no “Avanços e Solavancos” do Rodrigo, um dos primeiros bons posts do blog.

Politizando-nos
Um dos focos do nosso trabalho acabou sendo, por causa dos interesses da minha colega Carol, o tema da homossexualidade em âmbito jurídico e político. Para um leigo como eu, algumas postagens foram bastante esclarecedoras, como “Uniões homoafetivas e o reconhecimento do Estado”, que busca fazer um apanhadão de informações sobre a temática. Em outro texto, uma pesquisa interessante sobre o que a lei da criminalização da homofobia – o badalado PLC 122/06 – realmente prevê, buscando sanar dúvidas quanto ao seu real caráter: vai glorificar a homossexualidade? Vai tirar a liberdade de expressão religiosa?

Eu mesmo entrei na onda quando escrevi o “Educação sexual: um instituto necessário”, em que busquei responder aquela perguntinha que fica atrás da orelha de muita gente: uma educação que lide com as diversas formas de sexualidade “confundiria” as crianças?

Mas a pesquisa mais voltada para a utilidade pública, e que espero que tenha sido utilizada pelos leitores, foi a que a Carol fez sobre o registro de união estável entre casais do mesmo sexo, em que fala sobre as vantagens (e dificuldades) do procedimento, como se faz, etc.

Um ano. E agora?
Quem lê o Homomento já deve ter percebido que não estamos numa época de vacas gordas. As ocupações dos membros têm tornado dificultosa a participação, uma vez que gostamos de nos aprofundar minimamente nos assuntos sobre os quais escrevemos. Paira sobre nós uma aura de dúvida e insegurança: que será do nosso Homomento daqui pra frente?

Independente do que acontecer, é com muito orgulho que concluo esse um ano, feliz por saber que aprendi demais com esse simples blog e esperando, do fundo do coração, que tenha sempre compartilhado esse aprendizado com os leitores.


Dourado: o inimigo público dos gays?

30 de março de 2010

Esse ano resolvi quebrar uma tradição particular de oito anos e assistir ao Big Brother Brasil 10 (já tinha assistido ao primeiro). Alguns podem pensar que o fiz pela forte presença dos gays, mas confesso ter me posto frente à TV querendo me divertir, me propondo a não ficar analisando mídia ou sociedade.

Oito anos de abstinência me fizeram esquecer, no entanto, o quanto assistir ao Big Brother é por natureza uma experiência coletiva, que desperta involuntariamente o olhar crítico. Não só por conta da voz ativa do público na hora das eliminações, mas também pelos comentários das pessoas na rua, no supermercado, no trabalho, na faculdade. Percebendo que minha proposta inicial de só me divertir falharia, poderia ter parado de assistir ao programa, mas persisti. ‘Que mal tem?’, pensei. Estava, enfim, imerso na vivência do Big Brother e totalmente vulnerável à opinião alheia.

Meu primeiro stress veio quando um pesado julgamento moral caiu sobre a participante Tessália. Mesmo sabendo que sua impopularidade era anterior ao suposto boquete, fiquei chateado de ver como as pessoas no Brasil ainda têm dificuldade para lidar com assuntos sexuais. E de ver como a mulher só poder ser objeto sexual, nunca sujeito.

O segundo e definitivo stress veio com a discussão em torno do ex-atual BBB Marcelo Dourado. Suas pérolas de sabedoria – como “sou discriminado por ser heterossexual” e “homem hetero não pega AIDS” – indignaram Dicésar e o público gay, que evocavam com orgulho um termo: homofóbico. Torcedores dourados, no entanto, acusavam os homossexuais de paranóicos e exagerados.

Depois da acusação de Dicésar, o debate parece ter-se centrado na adjetivação do gaúcho: “afinal, ele É OU NÃO homofóbico?”. E foi senso comum pra todo lado, definindo que, “homofóbico é aquele indivíduo que tem nojo de gays, não pode nem chegar perto”, logo Dourado não o era por conviver com Dicésar e Serginho, logo realmente há uma paranóia gay em questão.

Ora, assim como ser homossexual, ser homofóbico não é uma sina para a qual o sujeito está predestinado. Dourado não É homofóbico de maneira definitiva, mas necessariamente FOI em alguns momentos. O que me irritou nessa história toda foi o fato de todos simplesmente ignorarem as atitudes do rapaz e se prenderem a uma discussão superficial de categorização. Enquanto fulaninha ou cicraninho eram rechaçados por fazer fofoca ou barraco, os gestos de Dourado eram totalmente ignorados – o que evidenciou uma total incapacidade, por parte do grande público, de perceber uma atitude preconceituosa.

Vejo hoje uma comunidade gay indignada com a perspectiva de vitória de Marcelo Dourado. Uma recente lista dos 10 maiores inimigos públicos dos homossexuais no Brasil menciona-o, junto a grande nomes homofóbicos tupiniquins como Magno Malta e Silas Malafaia. Veja bem: um BBB, junto a um senador e um líder religioso. Como se ele fosse um avatar da homofobia, que se espalhará pelo país caso o rapaz ganhe um milhão e meio de reais. Penso que mesmo se ele não ganhasse, essa luta já estaria perdida. O Brasil já provou sua indiferença para com o preconceito e não é a vitória de um ou outro integrante do Big Brother que vai reverter isso.

Depois de toda essa saga particular com o BBB, percebo que o inimigo não é um joão ninguém de comportamento tosco e previsível, que soma agora seus 30 minutos de fama e mais de um milhão de reais. É, sim, um senso comum que está cego para a homofobia, preso ao politicamente correto e incapaz de pensar no significado do preconceito para um indivíduo. Vamos voltar nossas forças contra ele, e não contra um participante de reality show.


O beijo da capa

11 de março de 2010

Via Observatório da Imprensa:

Pelo menos 27 pessoas cancelaram suas assinaturas do Washington Post depois que o diário americano publicou, em sua primeira página, uma fotografia de dois homens de beijando. A foto foi tirada na quarta-feira da semana passada (3/3), dia em que a Suprema Corte dos EUA autorizou o distrito de Colúmbia a realizar casamentos entre pressoas do mesmo sexo, e publicada no dia seguinte.

Essa notícia me chamou muito a atenção. Em primeiro lugar, a confirmação da incômoda sensação de que a lei está muito aquém da opinião comum. A exagerada ênfase na luta pelos direitos parece criar a ilusão de que poder casar e ter leis antihomofobia garante respeito alheio. Pois bem: não garante coisa nenhuma. Tão aí os Estados Unidos, que mesmo assistindo a um avanço progressivo das leis homoafetivas, convivem com manifestações violentíssimas de homofobia. “Esse tipo de coisa faz pessoas normais quererem vomitar”, disse um dos leitores do Washington Post sobre a fotografia. Mais comedida, outra leitora reclamou: “eu preferia que as imagens de capa não fossem tão perturbadoras, já que meus filhos podem vê-las na mesa do café da manhã”.

A foto da capa, pra vocês darem aquela vomitadinha

Mas prossigamos:

Leitores descontentes sugeriram que a imagem poderia ter sido estampada na seção metropolitana, e não na primeira página; outros, mais radicais, defenderam que ela não deveria ter sido publicada de jeito nenhum. O ombdusman do jornal, Andrew Alexander, diz que é normal receber reclamações após a publicação de fotos consideradas polêmicas. Ele cita como exemplo recente as imagens de vítimas do terremoto no Haiti.

De que adianta casarmos e o raio que o parta se um beijo nosso faz as pessoas quererem vomitar? Se é tão “pesado” para a cabeça das pessoas quanto imagens de vítimas de um terremoto? Não, sério. Esse parelelo do ombudsman é tão absurdo que beira o engraçado.

É claro que os direitos são prioritários em vários aspectos, mas vejo alguns militantes tão obcecados com eles que parecem esquecer a força da mentalidade e da cultura. Para eles, repito duas palavrinhas – constantes aqui no blog: mídia e educação.


Homomento discute a décima edição do BBB

29 de janeiro de 2010

Já faz duas semanas que o assunto da vez, tanto nos sites gays quanto na mídia em geral, é a décima edição do Big Brother Brasil: em especial, a presença de integrantes abertamente homossexuais na casa. A equipe do Homomento, que vem desde então discutindo suas opiniões sobre a questão, quis reunir algumas ideias soltas, sem o compromisso de um texto organizado e coerente. Convidamos todos à leitura e à discussão.

O óbvio ululante: a existência de homossexuais

Acho que o primeiro e mais óbvio ponto é que, bem ou mal, contamos com a presença de três homossexuais assumidos em um programa de altíssima audiência. É interessante compararmos a porcentagem de LGBTs no programa, de 17%, com a estimada para homos no “mundo real”, que varia de 10 a 19% de acordo com o contexto. Sabendo que a escala está mais ou menos correta, nos perguntamos: porque então toda a polêmica? Porque os apelidos como “Big Brother Gay”, se tem tantos lá dentro quanto aqui fora? A questão evidencia o quanto a homossexualidade é deixada à margem das discussões.

Trazendo a discussão à tona do lado de fora

Observar três homossexuais como ratos de laboratório pode ser instigante, e levar as pessoas a questionamentos diversos: “mas o que são homossexuais? Como eles são, o que fazem? Porque fazem? Qual a diferença entre eles e as outras pessoas?”. Por mais que seja condicionada pela edição do programa, essa curiosidade pode ser proveitosa.

61% das buscas na primeira semana de programa foram motivadas pela dúvida em relação a palavra Homofobia

Em um dos programas da primeira semana o participante Dicesar, conhecido como Drag Queen Dimmy Kieer, acusou outro competidor, Marcelo Dourado, de homofóbico. Em resposta, o Homomento foi selecionado para sanar, em diversas buscas, a seguinte questão: “Qual o significado de homofobia?”. Acredito que o post “Sobre a homofobia e seus significados” tenha suprimido a curiosidade de vários internautas, entretanto alguns curiosos mais práticos optaram pelo bom e velho dicionário, fato constatado pelo nosso blog:

O Priberam é o primeiro dicionário nas opções de busca do Google

Lidando com estereótipos

Enquanto Dicésar e Sérgio são gays mais característicos, com comportamento beirando o anedótico, Angélica é uma lésbica discreta e que não dá pinta nenhuma. Em outras palavras: notadamente, nessa edição o estereótipo da bicha é reforçado e o da sapatão já cai por terra. Mas pensemos um pouco além. Como se trata de um reality show longo, o comportamento dos participantes é exibido por semanas a fio, e é possível que os espectadores esqueçam um pouco da caricatura para enxergar as pessoas por trás delas, pondo em jogo vários preconceitos.

A ilha gay e a divisão forçada das tribos

A separação dos participantes em grupos também é intrigante. Não é preciso uma análise muito inteligente para perceber que a divisão não é exatamente lucrativa para os gays. Os LGBTS não criaram vínculos fortes de amizade entre si e preferiram se relacionar com pessoas de fora dos “Coloridos”. Até aí nenhum problema, afinal a intenção é o atrito, a grande falha na nossa visão é a segmentação forçada entre clãs, que reforça estereótipos e valida a marginalização do gay. A impressão do telespectador é que a repartição aconteceu da seguinte maneira “ok, temos três gays, gostaríamos de colocá-los em um nicho segmentado então vamos inventar outra denominação para os moradores que sobraram”.

Um diálogo que acompanhei entre a participante Angélica (assumidamente homossexual) e Cláudia (do grupo “sarados”) serve como exemplo. Na conversa a participante “sarada” falava que não entendia porque estava em seu próprio grupo porque em comparação a outros competidores, como por exemplo Eliéser (tribo dos belos), pouco frequenta a academia. Digo isso porque com exceção dos coloridos (em que todos compartilham algo: ser gay) nenhum outro grupo realmente tem alguma coisa em comum, visto que nem todos os “sarados” são realmente sarados, tão pouco os “belos” são todos “belos”, os cabeças nem comento, e os “ligados”, bom, os “ligados”, o que viria a ser “ligado”?

A normatização do politicamente correto

Uma contribuição que as edições anteriores do Big Brother já haviam trazido foi a vilanização da homofobia. Por incrível que pareça, todavia, não se sabe até que ponto isso é realmente positivo.

É nítido que na dinâmica do programa costuma-se construir heróis e vilões, simpáticos e malditos, coitadinhos e opressores. Nessa necessidade às vezes involuntária de divisão binária e estática, podemos observar uma série de comportamentos e posturas respeitosas a homossexuais que não se configuram exatamente a favor de esclarecimento e discussão por parte dos espectadores, mas como fomento à postura moralista e politicamente correta dos mesmos.

Condenar o comportamento de um participante abertamente homofóbico não significa em momento algum a aceitação automática do filho ou filha homossexual, por exemplo. Ou seja, não existe uma correspondencia real entre os valores aplicados ao programa de televisão e a vida prática de cada espectador. Por vezes a reprodução do comportamento padrão, como de condenação a atitudes homofóbicas, só respeita a necessidade de não se mostrar inadequado ao círculo social a que se pertence, sem haver o que se mostra realmente necessário, que seria a saudavel discussão do assunto.

Obviamente são casos e casos, culminando em alguns nos quais de fato existe dialogo e mudança positiva de percepção do outro. O que já suscita a pergunta: só esses casos já não tornam a iniciativa válida? A resposta fica a critério dos parametros de cada um.

A reprodução de opiniões é muito mais simples do que a real assimilação e mudança de postura. Resta a nós não torcer necessariamente para Sérgio, Dicésar ou Angélica, e sim para que esta postura amigavel da mídia e dos telespectadores não seja efemera tal qual tudo que resta das edições do Big Brother Brasil.

O universo externo gay

Esse post foi feito com muito carinho por toda equipe do Homomento. Agora que já opinamos, também queremos saber o que os leitores pensam sobre a presença dos gays na casa do Big Brother Brasil 10.


Carta Capital e a fome gay de informação

19 de janeiro de 2010

Folheando a Carta Capital dessa semana, centrada na polêmica abordagem da Lei da Anistia feita pelo Programa Nacional de Direitos Humanos, tive uma agradável surpresa: uma matéria de 3 páginas sobre homossexualidade masculina na Índia atualmente. Lembrando que há seis meses a sodomia foi enfim descriminalizada por lá, o artigo traz informações interessantes que fazem lembrar a distância entre legislação e realidade social. Nos conta que um clima de clandestinidade ainda paira sobre a vida gay indiana, que é bastante restrita à classe média.

Além das boas informações, com um trabalho competente de pesquisa, fotografia e entrevista, fiquei muito contente com a temática. Estamos acostumados a ler matérias sobre LGBTs apenas quando alguma polêmica os traz à tona: seja uma manifestação grave de homofobia – como o caso de Uganda, que chamou a atenção da comunidade internacional – ou seja uma controversa discussão em torno de leis. As histórias da reportagem, que dariam muito mais pano pra manga do que simples três páginas, são tão ricas que nos fazem inclusive questionar a importância de assuntos da moda, passados e repassados em sites de notícias.

Não entendo muito da profissão, mas percebo que às vezes o jornalista se perde procurando pautas de mainstream sem perceber a abundância de histórias que o cerca. Quando falamos de gays, trajetórias individuais de orgulho ou mesmo de conformismo serviriam como boa representação da realidade que nos cerca, cumprindo o papel essencial do jornalismo enquanto provedor de informação.

Quando constato a pobreza de conteúdo das ditas revistas gays que circulam por aí, mais preocupadas em ensinar a “dieta do tanquinho” do que em contar como vivem os homossexuais no Brasil e no mundo, e depois leio matérias como essa, sinto o peso da falta de uma mídia gay forte e representativa. O problema não é o fato de existirem revistas gays absurdamente semelhantes à Nova ou à Cláudia, mas o fato de não existir uma publicação mais séria para dar a opção. Assim, nas bancas, “gay” entende-se por “sarado”.

Ler a matéria da Carta Capital foi um discreto lamento e um suspiro de alívio, porque ao passo que senti a falta de me sentir bem informado em relação à comunidade, percebi que sempre teremos o interesse de bons profissionais inseridos em outros veículos midiáticos.


Nota:
Maurício Horta e Willian Vieira são os autores da belíssima reportagem da Carta Capital. Para quem gostou da abordagem vale a pena conferir o blog, twitter (@24tz) e flickr dos jornalistas. Neles eles relatam as histórias das viagens pela Ásia. Excelente trabalho, serve tanto para conhecer as peculiaridades da cultura oriental como também para reavaliar nossos axiomas ocidentais e verdades  inquestionáveis. Termino o post com um incentivo à leitura e uma demonstração da qualidade do texto do 24 Time Zones:

“Embora durmam juntos, não são gays. Sim, homens indianos tendem a demonstrar carinho entre si em níveis que ocidentais identificariam necessariamente como gay. Mas demorará muito ainda para que nós consigamos entender o que cada olhar que se troca no metrô ou cada elogio pode realmente significar”

[Texto por Pedro; nota por Mariana]


História da GLAAD

15 de janeiro de 2010

Recentemente a Aliança Gay & Lésbica Contra a Difamação (em inglês, formando a sigla GLAAD) anunciou os indicados para seu prêmio anual. Muito se tem comentado sobre os escolhidos – Lady GaGa, os seriados Glee e Grey’s Anatomy, a revista People e o filme Prayers for Bobby, para mencionar alguns aleatórios – mas será que todos sabem exatamente o que é a GLAAD e o que é feito por eles? A tradução dessa sexta é um texto emitido pela organização contando um pouco da sua história e do que é feito por lá. Por mais que tenha ares de propaganda, bem release oficial mesmo, vale a pena a leitura.

História da GLAAD
Pense em algum tempo atrás, quando as palavras “gay” e “lésbica” eram tabus na mídia – um tempo em que a manchete do seu jornal estampava, na primeira página, histórias homofóbicas, um tempo em que a indústria do entretenimento não pensava duas vezes antes de produzir imagens estereotipadas e preconceituosas de gays e lésbicas. Não faz tanto tempo quanto você pode pensar.

Menos de 25 anos atrás, antes da formação da Aliança Gay & Lésbica Contra a Difamação (GLAAD), representações de lésbicas e homens gays tendiam a cair em uma das duas categorias: difamatório ou inexistente. Desde sua criação, o impacto da GLAAD na visibilidade da nossa comunidade tem sido de grande alcance. Não só os funcionários e voluntários do GLAAD transformaram a maneira como gays e lésbicas são retratados na televisão e nas notícias, como tornamo-nos também uma importante fonte de recursos e informações para o entretenimento e tomadores de decisão da mídia. A Entertainment Weekly nomeou a GLAAD como uma das entidades mais poderosas de Hollywood, e o Los Angeles Times descreveu-a como “possivelmente a mais bem-sucedida organização de lobby da mídia para a inclusão”.

Formado em Nova York em 1985 para protestar contra a grosseira, difamatória e sensacionalista cobertura do New York Post da AIDS, o trabalho da GLAAD rapidamente se espalhou por Los Angeles, onde começou a educar a indústria do entretenimento de Hollywood sobre a importância das representações mais precisas e realistas na tela. Conforme o trabalho da GLAAD cresceu, a organização ganhou espaço nacional, com escritórios em Nova York, Los Angeles e San Francisco. Para servir os interesses regionais e locais de mídia, o Programa de Mídia Regional da GLAAD cresceu para ajudar comunidades locais em todo o país mobilizando campanhas, treinando a mídia e outras ações.

Tendo cultivado relações com profissionais de mídia através de duas décadas, lista de realizações da GLAAD denota uma contribuição significativa e contínua, à igualdade LGBT. Não foi até 1987, após uma reunião com o GLAAD, por exemplo, que o The New York Times mudou sua política editorial para usar a palavra “gay”. Vinte e um anos depois, o projeto Anunciando a Igualdade resultou em mais de 1.000 jornais em todo o país – incluindo o The New York Times – optando por incluir anúncios de gays e lésbicas junto a outros anúncios de casamento.

A GLAAD não atinge apenas os bastidores da mídia, mas também tem impactado milhões através de jornais, revistas, cinema, televisão e campanhas de visibilidade. Nós chamamos a atenção da mídia para: o ódio motivado assassinato de Matthew Shepard, Arthur “JR” Warren, Brandon Teena, Fred Martins, Gwen Araujo e outros; a defesa anti-gay de “Dr. Laura” Schlessinger, letras de Eminem ódio; os heróis gays e vítimas de 9-11; os anúncios de “ex-gays”, e mais recentemente, as tentativas de oficiais da Igreja católica de envolver padres gays inocentes em histórias de abuso sexual.

Por causa do trabalho da GLAAD, histórias e temas ligados a gays e lésbicas são tratados nas publicações nacionais e locais, nos filmes e na televisão. Representações negativas e indelicadas da comunidade têm diminuído, enquanto as lésbicas e homens gays têm sido cada vez mais incorporados em quase todo tipo de plataforma de mídia – das novelas às histórias em quadrinhos. Mas há muito trabalho ainda a fazer. Representações de transgêneros e bissexuais, de todo o espectro da diversidade da nossa comunidade, e representações precisas de nossos relacionamentos são apenas alguns domínios onde GLAAD continua a concentrar os recursos e atenção.

Atenta às constantes mudanças da mídia na atualidade, a GLAAD continua fornecendo aos jornalistas e profissionais de mídia informações oportunas, abrangentes e concisas, ampliando a representação da nossa comunidade de notícia em notícia, através de uma eficiente e poderosa combinação entre advocacia, educação e visibilidade.


Destaque da Semana: Casamento gay em Portugal

10 de janeiro de 2010

Se levarmos em consideração que até 1982 a homossexualidade era considerada formalmente como crime em terras lusas, não nos restam dúvidas de que a comemoração em torno da aprovação da proposta de lei favorável ao casamento entre pessoas do mesmo sexo é mais do que merecida.

Nessa sexta-feira (08 de janeiro de 2010), a Assembléia da República Portuguesa aprovou a lei que colocaria o país junto dos 5 demais países europeus que também permitem o casamento civil entre gays. Ao que tudo indica, agora além da Holanda, Suécia, Noruega, Bélgica e Espanha teremos Portugal, consolidando uma Península Ibérica mais igualitária, ao menos no discurso.

Acontece que, o primeiro passo em direção da obtenção desse direito foi dado, mas mesmo com a aprovação defendida pelo primeiro-ministro José Socrátes, ainda se faz necessária a confirmação do presidente da república, Aníbal Cavaco da Silva. O presidente tem poder de veto sobre a lei, que nesse caso voltaria para votação na Assembléia. Caso contrário, se aprovada por Cavaco da Silva, os primeiros casamentos lusitanos começariam já em abril de 2010.

Presidente português Aníbal Cavaco da Silva e o primeiro-ministro José Sócrates

Embora Cavaco da Silva seja o primeiro presidente de direita eleito após 1974 (fim da ditadura Salazarista) poucos acreditam que ele vá vetar a lei, tendo em vista a ampla base favorável a mesma na própria Assembléia portuguesa.

A euforia em torno dessa primeira fase justifica-se não só na improvável recusa do presidente, como no nó desfeito na garganta de muitos portugueses que viram ainda em 2008 a possibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo se esfacelar ao ser, como eles próprios chamam, “chumbada” ainda na Assembléia.

Portugal, país em que maioria da população é católica e que no ano passado adotou medida controversa a respeito da doação de sangue, ao proibir homens gays alegando que estes constituem um “grupo de risco”, não foi preenchido unicamente de comemorações e festas com a aprovação do casamento. Além de protestos por parte da população, a própria bancada política encontra-se em constante conflito que parece agravado pela votação da lei.

A base de apoio é formada pela esquerda e pelos verdes, que juntos compõe a maioria das cadeiras. O restante divide-se entre aqueles que defendem questões morais e os que julgam essa como sendo uma questão de menor relevância frente aos problemas econômicos enfrentados pelo país, como a alta taxa de desemprego. A própria imprensa portuguesa grifou a postura adotada pelos comunistas como discreta e omissa:

Comunistas muito apagados do debate

Já o PCP, bastante calado durante o debate, declarou que os comunistas vão abster-se na votação dos projectos do Bloco de Esquerda e dos Verdes, uma vez que «tal como na anterior legislatura» o PCP «continua a considerar que esta é um matéria mais complexa cujo debate é necessário prosseguir», disse o deputado João Oliveira.

Vale lembrar que a a lei não contempla a adoção por casais homossexuais, que parece ser a próxima pauta dos ativistas uma vez que o casamento se concretize como já é esperado. Questionado a respeito dessa questão, o primeiro-ministro Sócrates, retrocedeu em seu discurso igualitário, alegando: “No casamento trata-se da liberdade individual. Na adopção é diferente, há o interesse de terceiros. O mandato do PS é com o casamento, não com a adopção.”

(obs.: A decisão do presidente não tem uma data exata, aguardaremos torcendo para que nas próximas semanas uma resposta positiva seja dada.)


Fernanda Young, Playboy e as mulheres

18 de novembro de 2009

Fernanda Young autografa sua edição da Playboy

Graças a um atraso na distribuição da Playboy, só ontem pude comprar (ou melhor, ganhar – thanks, wifey!) a edição cuja capa traz Fernanda Young vestida de coelhinha. E não, minha intenção aqui evidentemente não é a de fornecer um relato desnecessário e apelativo da minha interação com a revista. Na verdade, a escritora já poderia ter figurado no Homomento há mais tempo: em setembro, ela disse que tentou ser gay e não conseguiu. Recentemente, ao avaliar o impacto de seu ensaio entre nosotras, ela disse se orgulhar de ser atraente para as lésbicas. Além disso, um de seus romances, O Efeito Urano, publicado em 2001, trata de uma relação entre duas mulheres.

Mas nosso comentário à edição se deve a outro fato potencialmente homoerótico: tenho observado muitos comentários de mulheres héteros acerca dessa edição, e mesmo de homens que disseram que suas parceiras adoraram o ensaio. Esse interesse feminino pela Playboy deve-se, no meu entender, a dois fatores: o público-alvo da edição e a identificação com um determinado padrão de beleza.

O público fiel da Playboy critica a decisão editorial de retratar uma mulher “que nem bonita é” (visão que explicita a concepção de que a beleza feminina é loira e peituda). Eu, que não faço parte do público-alvo das revistas masculinas, posiciono Fernanda Young exatamente dentro do meu padrão de beleza: ela é intelectual, tatuada, forte, desbocada, segura dentro de seu próprio corpo. É a cultura (compreendida aqui como conjunto de valores socialmente compartilhados, não como formação escolar, que fique claro) de cada um que define o que lhe será bonito. Em entrevista à revista Quem (via ACapa), a escritora demonstrou ter consciência de que o público que comprará a sua Playboy não é o mesmo das demais edições da revista.

“O público que imagino que vá comprar minha revista é a pessoa que tem a intenção erótica de me ver nua, o gay que se interessa por mim, a pessoa que está chocada e quer me “chochar”… mas sei que muita mulher vai comprar! A gente gosta de se ver”

Sobre O Efeito Urano, a autora comentou que acha "muito libertária" a possibilidade de uma leitora se identificar com o amor entre duas mulheres

O fato de incluir mulheres no público-alvo desde a concepção do ensaio já é um diferencial em relação à esmagadora maioria dos produtos pornográficos. Salvo raras exceções, nenhuma delas no Brasil (que eu conheça, ao menos – vou adorar descobrir que estou errada, se alguém tiver novidades para me contar nos comentários), a pornografia é produzida por e para homens. O consumo de produtos pornográficos por mulheres é tratado como marginal, incidental. E se por um lado isso leva a um estranhamento geral da nudez masculina, por outro leva a uma maior familiaridade com o corpo da mulher. Na entrevista à Quem, a própria Fernanda Young admite essa relação com o nu.

“Não perco tempo vendo revista de homem pelado”, revela. “Acho nojento. Aquela coisa horrorosa de barriga tanquinho, músculos… É tão musculoso que fica com a cabeça pequena. Me lembra um açougue. E eu, como vegetariana, não gosto de açougues [risos]. Esteticamente, a mulher tem um corpo lindo. O ventre é lindo, a bunda é bonita. Não precisa ter atração, mas o feminino é belo.”

Beleza masculina e consumo de G Magazines e afins por mulheres (bem como o consumo de revistas masculinas por lésbicas) são temas que mereceriam um post à parte, e infelizmente tenho que deixá-los de lado nesse artigo que já começa a ficar muito grande. A questão é que a identificação é uma forma de sentir desejo e, por conseguinte, consumir pornografia. Se as mulheres não são sujeitos para as revistas masculinas, uma das formas de desfrutá-las é pensando não em possuir o objeto retratado, mas em como seria ocupar o seu lugar.

Encontrei, nos comentários da coluna de Arnaldo Branco na Revista Zé Pereira, uma avaliação dessa edição da Playboy que ilustra bem o que estou dizendo. É Marina, “uma mulher comum” como a própria se define, quem contesta o texto (bastante grosseiro) do cartunista, que critica a alegria das mulheres com a nudez da escritora.

Tenho certeza que a FY não quis salvar o erotismo visto pelos olhos dos machos reprodutores que coçam o saco e salivam quando as gostosas passam na rua com a calça jeans enfiada no rego. FY também não quis fazer um ensaio pseudo-intelectual, pois, como ela mesmo disse, isso não existe. Ensaio de nu na playboy é simplesmente um ensaio de nu na playboy. (…) Por fim, eu como mulher comum, adorei ver FY nua, e, pra mim, seu ensaio realmente me serve como uma tentativa de trazer à tona um outro tipo de erotismo: aquele que a gente aprecia e até se vê ali, aquele que tem um contexto e que chama atenção por isso. Nesse ponto, FY arrasou. (…) O belo é relativo e a maior graça de todas é justamente poder ter como escolher. Pra mim, mulheres com coxas de cavalo e alaranjadas de tanto bronzeamento artificial me dão um nojinho. FY me dá tesão. Você não concorda? Ótimo. Viva as diferenças. Mas todo mundo tem que ter a chance de celebrar isso, não?

Ao aparecer vestida na capa, FY deixa claro que o erotismo de seu ensaio vai muito além da nudez

O ensaio, de fato, traz um erotismo que não é o dos retratos ginecológicos. Acostumada a brincar com a cultura pop, Fernanda Young veste a icônica fantasia de coelhinha já na capa. Nas demais fotos, resgata outros elementos da cultura erótica – espartilhos, bondage, meias de seda. A produção caprichada não deixa que o ensaio caia na vulgaridade.

Mas o mais legal é a possibilidade, que podemos supor a partir da revista e das declarações da escritora após sua publicação, de que aquele ensaio não tenha sido pensado para seus leitores e sim para a própria Fernanda Young. Ela alfineta a ala masculina de seu público, dizendo que fica feliz ao notar que os homens continuam sentindo medo dela. Depois, provoca a totalidade dos compradores de sua Playboy: “São fotos eróticas. Espero que muita gente se masturbe. Vou ficar felicíssima se isso acontecer.”

Acima de tudo, fica a sensação de que Fernanda Young está se divertindo (e muito) com a repercussão de sua passagem pela publicação cujo nome tornou-se sinônimo de revista masculina. Para quem não treinou seu olhar para a crueza da pornografia, acho que isso – a demonstração de estar genuinamente gostando da coisa – é o que torna tudo muito mais interessante.


Cultura nerd colorida

30 de setembro de 2009

Há muito vem se conversando aqui sobre os guetos e as diversidades dentro da concepção formada e divulgada de “mundo gay”. Por isso resolvi divulgar uma iniciativa que além de válida comprova que os interesses não devem, nem podem, ser generalizados, fato esse que causaria a mutilação da própria comunidade que prega a diversidade.

Falo aqui do Gaylactic Network que foi criado em 1986 na cidade de Boston, nos EUA, visando a divulgação e a discussão em torno das representações LGBT (ou até mesmo a falta delas) nas diferentes mídias, mas o diferencial é que dedicam-se à genêros tipicamente “nerds” como a ficção cientifica, mundos fantásticos e horror.

Hoje a Gaylactic Network já conta com 12 grupos afiliados, dentro dos Estados Unidos (exemplo do Lambda Sci-Fi (DC Area Gaylaxians) em Washington, DC) e também no Canadá (o Gaylactic Toronto Alliance, Toronto, Ontário).

Gaylactic_logo

O intuito de conectar os interessados que partilham interesses parecidos vem funcionando, desde grupos de discussão na internet até a organização de eventos, como o Gaylaxicon.

O Gaylaxicon

gaylaxicon

É um evento anual, realizado desde 1988, e sediado em diferentes cidades do país – já abrigaram o encontro cidades como Philadelphia (1992), San Diego (2004) e Atlanta (2007). Os participantes e organizadores encaram o evento como uma maneira de incentivar, divulgar e discutir assuntos que normalmente não teriam espaço nos convencionais, tradicionais e famosos encontros sobre o tema. Buscam então abordar tanto as publicações e produções independentes que abordam assuntos do interesse da comunidade LGBT, como debates mais especificos, como por exemplo, sobre o que é produzido no mainstream dos quadrinhos, repercussão de seriados com personagens lésbicas (de Xena a L World) e a inclusão de personagens gays nos jogos de video game.

Mesa de discussões do Gaylaxicon 2008 (Bethesda, Maryland)

Mesa de discussões do Gaylaxicon 2008 (Bethesda, Maryland)

Na edição de 2009, que será realizada dos dias 9 a 11 de outubro na cidade de Minneapolis, Minnesota, vemos uma programação plural, que contempla um variado número de interessados, seja na cultura geek, na queer, ou mesmo simples curiosos:

Do Gay Writers Do It Better? : Escritores heterossexuais conseguem abordar assuntos LGBT com sucesso ou necessariamente é preciso ser gay para tratar do assunto?

Lesfic Fantasy – Beyond the Blonde and the Brunette: Após o sucesso do casal Xena e Grabrielle, uma discussão a respeito dos novos rumos das histórias que tangem temas homoeróticos.

Putting the GAY in Games: Uma revisão das aparições de personagens gays nos jogos de video game.

Wonder Woman Appreciation Panel: O que faz a Mulher Maravilha ser um ícone, tanto dos homens quanto mulheres (gays)?

As mesas se dividem nos mais peculiares assuntos e recortes, podendo ser acessado na integra no site do Gaylaxicon. O número de frequentadores vem crescendo desde seu ano inaugural e já são esperadas pessoas de todo o país para a edição deste ano.

Caso os assuntos lhe despertem interesse vale ressaltar que por mais que nos encontremos geograficamente impossibilitados de comparecer, é só mandar um e-mail, ou se comunicar com eles através de algum dos vários meios que eles disponibilizam e ficar sabendo o que foi discutido. Afinal, tecnologia é com eles mesmo.


O tiro bem dado da Arezzo

23 de setembro de 2009

Há uns dias atrás, olhando alguns blogs com minha namorada, me deparei com uma situação um tantinho desconfortável.  Ao visitar um o blog Alice in lesboland, li o texto intitulado “Sapataria Arezzo” que falava sobre o comentadíssimo ensaio das globais Juliana Paes e Cléo Pires. Nada de novo até então, até um certo atraso dada a data de divulgação (julho). Mas o que quero comentar não são as fotografias ou a campanha, e sim o comentário da blogueira. Transcrevo:

“Nós gays sempre reclamamos que somos excluídos da mídia, especialmente no que se refere a programas de TV e anúncios. Agora que se lembraram de nós, acho que merecem um elogio, não? Até porque deve ter um monte de homofóbico-chato-careta metendo o pau, e nós não queremos que a Arezzo ache que teve uma má idéia em colocar aquelas duas gatas se insinuando dentro d’água, queremos? Vai que na próxima campanha ela põe a Cleo se esfregando num Cauã Reymond da vida? Cruzes! Então faça a sua parte, sapa! Manda um e-mail bem fofo para eles aqui, manda! Eu já mandei o meu.”

Juliana Paes e Cléo Pires para Arezzo, inclusão?

Juliana Paes e Cléo Pires para Arezzo. Inclusão? Onde?

Sei que o escopo do blog é totalmente diferente do Homomento e que trata de assuntos mais leves, usando artifícios como o humor e a naturalidade. Infelizmente nenhum desses métodos justifica, para mim, uma visão tão ingênua. O ensaio pode ser bem feito, ter uma estética bacana, bons efeitos, mulheres bonitas, ser pouco apelativo em relação ao que normalmente tange nossa realidade, não importa. A última coisa que se pode imaginar é que em um ensaio como esse ajude, mesmo que minimamente, qualquer lésbica nesse brasil varonil, minha gente!

Um tiro certeiro para não ricochetear

Engana-se a blogueira, leitor, ou consumidor da Arezzo que enxerga essa campanha como um ensaio ‘lésbico’. A boa estratégia de marketing, feita com carinho pelos marketeiros/publicitários/assessores da marca, inteligentemente associa o comportamento das mulheres a uma relação homossexual. Mas na verdade não é isso que acontece, aliás, se a análise das fotos for feita com um pouquinho mais de carinho, é possível observar que se trocada qualquer uma das atrizes por um homem, um se simplesmente excluída da foto, o que temos é mais um ensaio exatamente igual a tantos outros.

A Arezzo opta por contratar para suas campanhas os principais destaques das telenovelas, e nessa eles não fugiram à regra. Talvez o que mais chame atenção seja a concomitância da campanha com a entrevista concedida ao portal A Capa pela Juliana. Um trechinho:

“O que você acha do preconceito contra homossexuais?
Acho uma atitude tão besta e muito pequena. Afinal, o mundo é feito de pessoas diferentes em todos os sentidos. O ser humano tem que saber viver com as diferenças e respeitar o próximo, não só pela sua opção sexual (sic), mas pela raça, condição social, intelectual.

Qual a sua opinião da adoção por casais gays?
Família se constitui por amor e existe amor entre iguais. Para mim, um casal gay tem a mesma condição de criar e educar uma criança que um casal heterossexual.”

Obviamente mora aí um excelente assessor, que habilmente distribuiu o bom e velho release amigo para um dos principais sites LGBT do Brasil, e com certeza tratou de responder com muito carinho e atenção as perguntas enviadas a Juliana. Essa iniciativa inteligente reprimiu qualquer levante homossexual, tendo por base a postura gay-friendly e o suposto ensaio pró-lésbico. Caso encerrado.

Eu não sei qual é a postura real da Juliana Paes, se a Cléo Pires curte gays, se as duas acharam bacana a iniciativa e por isso aceitaram ou se foi porque o pagamento foi satisfatório. Enfim, para mim pouco interessa, porque tudo (e quando eu digo tudo é TUDO) relacionado a campanhas comerciais tem uma estratégia, um objetivo e um interesse. Os LGBT são, enquanto grupo, um nicho a ser exploradíssimo no mercado brasileiro dos próximos anos, então é imprescindível que se filtre os estimulos para não cair em jogadas de marketing bestinhas, como essa.

juju